éramos mais de 100- 2025

 Sabes pai, já passaram umas horas que pisamos o palco do teatro, eramos muitos, mais de 100. Fomos com o sonho e a coragem que só os colectivos tem, ensinaste-me isso e tinhas toda a razão. Quando soubesses desta minha ideia louca, terias dito, “mas tu não sabes cantar” eu iria na mesma e tu lá estarias, para me apoiar como sempre, ao teu lado a mãe diria “que esta ela ali a fazer, só gosta de palhaçadas” responderias “deixa a gaita ser feliz”. E terias chorado, como sempre. Pai, cantei com amigos teus de uma vida, com amigos meus, novos e antigos, todos juntos só pelo simples prazer de cantarmos juntos a liberdade. Terias gostado. A tua neta foi e os teus bisnetos também, todos estavam felizes por eu ter tido a coragem de enfrentar mais um obstáculo, sim porque cantar sempre foi um grande obstáculo, ter-te como comparação não me facilitou o caminho, mas fazer o quê se não recebi essa tua arte. Mas ali, junto com todas as vozes de abril, a minha não destoou, segui o teu ensinamento “faz sempre o teu melhor”, fiz, entre o teu amigo Serra com a sua voz potente, e a Midus com a sua voz afinada, fui feliz e senti-me segura, amparada, entre os braços de gente de bem. Ficavas feliz também, querias sempre que eu fosse feliz, mas ficarias feliz especialmente com as escolhas das canções, eram de resistência, de luta e de esperança, como gostavas. “resistimos e lutamos, porque acreditamos que pode ficar melhor” dizias sempre. Ali, cantamos em uníssono a resistência e a esperança. Na plateia muitos choraram, como tu chorarias, sei que sim, sempre tiveste lagrima fácil, mas também nós nos emocionamos, também alguns de nós deitamos uma lagrima, e há lá coisa melhor para se sentir quando se canta. Foi emotivo o final, a Grândola pois claro, não poderia ser outra e no fim, os abraços dos amigos, dos conhecidos, os abraços que trocamos entre nós, tudo por e com amor. O teu bisneto, este ser maravilhoso, que herdou o teu coração gigante, correu envolvendo-me no seu abraço carinhoso, segredando-me ao ouvido “para o ano canto contigo avó”, e naquele abraço pequeno, mas gigante, senti o amor da continuidade, da passagem de testemunho pelo que é belo e colectivo. Mas faltou-me o teu abraço pai, faltou-me tanto o teu abraço, o teu beijo, o teu carinho, faltou-me a pergunta de sempre “estás feliz?” e eu responderia que sim, e abraçar-me-ias de novo repetindo “é o que importa”.

Ontem cantamos no teatro Pai, éramos mais de 100, terias chorado e gostado.

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