Bocage - o poeta maldito

 Em Setúbal hoje há 258 anos nascia, Manuel Maria do Bocage, um dos maiores poetas portugueses. Bocage era o poeta maldito do seu tempo, o escarnio e humor negro da sua poesia fizeram com que poucos o amassem, mas muitos o odiassem, o que acontece até hoje.

Bocage, ao contrario do que seria de esperar, por ser uma menina, filha de um homem que tirou a 4ª classe já passava dos 20 anos, foi o 1º poeta que conheci. O primeiro que li, o primeiro que escutei declamar, exatamente pela voz do meu pai. O porquê é simples, ele foi diretor e fundador do Bocage, associação recreativa que existiu em Évora, ali para os lados do Teatro Garcia de Resende, ( e que deu vida a uma outra do nosso tempo) durante vários anos, que se dedicava especialmente à leitura, à escrita, à declamação. Também teve teatro e desporto, mas a sua base foi sempre a Palavra. A base da criação do Bocage foi ensinar a ler e escrever gente que não tinha aprendido em criança, a sua criação tinha como base diminuir o analfabetismo e criar pensamento critico, coisa muito complicada no tempo do fascismo. As tertúlias com intelectuais portugueses e brasileiros foram um marco na vida do Bocage. Os serões de leitura e de declamação faziam parte do cotidiano da Sociedade Recreativa. Foi ali naquele espaço de cultura que o meu pai passou alguns anos da sua vida, foi onde leu sobre coisas do mundo que desconhecia, foi onde desenvolveu o gosto pelo saber isto antes de eu nascer. Foi depois natural que ele me declamasse poemas do Bocage, levando-me a querer descobrir mais sobre o poeta de que me falava.
Não é o meu poeta preferido, mas será sempre o primeiro poeta que escutei e li.
Em dia de aniversario de Bocage, deixo-vos um dos poemas que o meu pai me decalvava à hora de dormir, enquanto os pais dos meus amigos lhe contavam a historia da Branca de Neve e os 7 anões.
Aquele, a quem mil bens outorga o Fado,
Desejo com razão da vida amigo
Nos anos igualar Nestor, o antigo,
De trezentos invernos carregado:
Porém eu sempre triste, eu desgraçado,
Que só nesta caverna encontro abrigo,
Porque não busco as sombras do jazigo,
Refúgio perdurável, e sagrado?
Ah! bebe o sangue meu, tosca morada;
Alma, quebra as prisões da humanidade,
Despe o vil manto, que pertence ao nada!
Mas eu tremo!...Que escuto?...É a Verdade,
É ela, é ela que do céu me brada:
Oh terrível pregão da eternidade!
Bocage, in 'Rimas'
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