José Osório o meu convidado mais corajoso
Diz o fac que fez 10 anos que morreu um dos entrevistados mais corajosos que comigo se cruzou. No tempo em que a SIDA era um tabu, porque tinha vários conhecidos que sofriam da doença e porque havia lugares na cidade onde não os serviam, resolvi fazer uma entrevista sobre o tema, uma tentativa de desmistificar "o mal" como lhe chamavam . Pedi a vários, não quiseram, tiveram medo, não se quiseram expor, um deles disse-me "só ha um fulano que fala contigo, mas não mora cá" Que seja entrevisto-o por telefone. Com o contacto dele tentei varias vezes e só por muita insistência consegui que me atende-se. Expos a coisa tentando não forçar muito e depois ouvi do outro lado um "Nao!" fiquei em silencio uns segundos e quando já ia despedir-me do outro lado ouço dizer "se quiser fazer algo sério e que nos possa ajudar, vou ai à entrevista e levo um médico que percebe a doença, e pomos tudo a nu, coisa por telefone e minutos nao nos servem" Ceus, muito mais do que eu estava a pedir. aceitei na hora. Marcamos o dia e deixei ao seu critério o medico convidado. No dia marcado entraram em estúdio a Drª Odete Ferreira e José Osório. Depois dos cumprimentos da praxe e logo que se senta José Osório desarma-me pela 1ª vez "gostei de ti, senti sinceridade no beijo", só ai reparei que os tinha beijado como fazia sempre que recebia um convidado (habito que só perdi com esta maldita pandemia). Pensei, ok esta quebrado o gelo, acalma-te e faz a entrevista como estava planeada, comecei, apresentei os convidados e fiz a primeira pergunta da forma mais técnica que me foi possível, fui surpreendida pela 2º vez, José Osório devolve-me a pergunta de forma clara "queres saber se tenho SIDA? É isso? Se é isso a resposta é sim! agora podemos falar de forma a que as pessoas percebam? Eu que tinha tentado absorver muita informação sobre o tema, que a maior parte não tinha percebido, resolvi deixar as minhas notas de lado e iniciei uma conversa com 2 pessoas extraordinárias que tinham muito a ensinar-nos sobre um tema do qual ninguém queria falar. Foram 3 horas de conversa, na ultima hora, como planeado com muitas perguntas do auditório, todas respondidas quer por um quer por outro, sem subterfúgios, com verdades ditas na 1º pessoa, com muitas incertezas assumidas e com a certeza de que a luta era difícil mas que eles estavam cá para a travar. Estive com ele mais meia dúzia de vezes, sempre em sessões de esclarecimento sobre o tema, numa luta que travou durante anos e da qual foi um dos rostos mais visíveis, sempre com a mesma coragem, sempre sem medo de dar o corpo às balas. Nessa tarde de sexta feira aprendi muito sobre um tema que não conhecia, aprendi também a fazer perguntas difíceis logo de caras, o que muito me ajudou noutras ocasiões e ajudamos a diminuir o estigma, facto que me foi dito uns dias depois por um conhecido que tinha sido atendido numa pastelaria onde já não lhe serviam café ha meses.
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