A prima Brigite

 Lendo uma história sobre beleza e violência, lembrei-me da prima Brigite. Brigite era prima em 2º grau do meu pai, morreu ainda ele nem imaginava que eu viria ao mundo, só conheci a sua história. Tal como muitos os pais de Brigite trabalhavam no campo numa herdade perto daqui, foi lá que ela nasceu, uma menina entre 7 irmão. Por lá cresceu e também lá começou a trabalhar era miúda. À medida que ia crescendo começaram os problemas de toda a família e ate de parentes que ali prestavam serviços sazonais, Brigite era linda, diferente das moças do campo, esbelta, com uns olhos negros e uma pestanas enormes. Um rosto fino e claro e um cabelo ondulado que caia sobre os ombros. Escusado será dizer que naquele tempo ela se tornou uma tentação e uma possível presa para muitos homens da zona. Os pais, em aflição criaram com os irmãos e demais parentes uma proteçao apertada a Brigite, para onde ela ia, ia sempre algum dos homens da família e mesmo assim às vezes viam-se aflitos para a proteger de ataques . A sua beleza começou a criar fama e ficava cada vez mais difícil proteger a jovem de um ataque, mas eles lá iam conseguindo. Num inicio de verão, voltou vindo de Lisboa, com o curso de bacharel o filho do dono da herdade, foi um alvoroço na propriedade. O pai orgulhoso do mancebo reuniu todos os trabalhadores e procedeu à apresentação do patrão novo. Vindo da capital, armado em doutor, cheio de posse pelo dinheiro que detinha e provavelmente sem noção do que é caracter, assim que bateu os olhos em Brigite todos à volta se aperceberam do perigo. Protege-la de trabalhadores rurais, de parceiros de infortúnio era fácil, bastava uns murros e aquilo ia ao lugar, defende-la do patrão novo eram outros quinhentos. Logo nessa noite foi decidido pelos familiares que Brigite tinha que partir e ela lá foi com 2 dos irmãos como guardiões, era preferível perder 3 pares de mãos no trabalho que entrar em conflito com o patrão. Mas o mancebo não aceitou essa partida de forma tranquila, tanto fez que o patrão velho foi obrigado a ir junto do pai da moça, queria porque queria saber onde estava, não conseguindo tirar isso do pai nem sob ameaça, desistiu. Mas o filho não! Esse continuou a insistir, ate que numa das insistências o bom do pai de Brigite disse ao patrão que a traria de volta se o patrão novo casasse com ela logo no dia da chegada. Pensava o bom do homem que aquilo faria terminar a história mas não, o moço tinha encasquetado que queria a Brigite, ate porque nesse meio tempo muitos lhe tinham falado da fama da sua beleza e aceitou. Incrédulos, mas sem hipóteses de faltar à palavra dada, os pais foram buscar Brigite a casa de uma tia onde estava escondida. Chegada à herdade foi casada nesse mesmo dia com o jovem patrão. Dizia o meu pai que trajada de noiva parecia uma rainha, que o jovem mancebo não cabia em si de vaidoso, que ate faziam um par muito elegante. O casamento iniciou-se sem grandes percalços, parece que os jovens ate se davam bem, porem quando começaram a frequentar os salões, jantares e encontros na cidade tudo começou a desandar. Brigite não se sabia comportar como as damas das famílias ricas, o marido era gozado pelos seus pares, a maior parte por inveja da beleza da moça e ele começou a ficar enraivecido. De cada vez que voltavam a casa, o marido descontava na pobre Brigite a raiva que tinha aos seus pares, aquilo era sabido por todos mas ninguém se podia meter. Brigite começou a perder a vontade de sair com o marido, ele apesar de também preferir que ela não fosse (achava o meu pai) tinha um medo de morte que ela se lhe escapasse e começou a tranca-la em casa quando saia. Quando retornava, por raiva vá-se lá saber de quê, batia-lhe mais ainda. Aos poucos Brigite começou a ficar presa ate quando ele estava, com o tempo a única pessoa que lhe podia chegar perto alem dele, era a criada que levava a comida e aos poucos a comida foi diminuindo, diminuindo e Brigite começou a emagrecer. Sem ver o sol, sem ver gente, sendo mal alimentava e provavelmente sem ver sentido à vida, foi definhando e 3 anos depois de ter casado Brigite morreu. Os pais e os irmãos amaldiçoaram-se pela decisão tomada, mais valia terem deixado que ele a desonrasse e a deixa-se como faziam a tantas moças na época. Mais valia terem partido todos e procurado outro emprego. Mais valia... mas tinha sido assim, a beleza de Brigite tinha-a condenado. O poder de um homem sobre ela tinha-a deixado morrer. Depois de a sepultarem todos partiram, ninguém quis ficar naquele lugar, nenhum parente voltou a trabalhar para aquele agrário. Souberam depois que voltou a casar com uma moça da sociedade eborense feia que nem um noitimbo.

Brigite e a sua história serviram durante a minha adolescência para o meu pai me dizer muitas vezes "foge de rapazes que sejam ricos, não vai dar certo". Nunca verificamos isso felizmente não puxei a beleza da prima Brigite, mas pelo mundo há muitas Brigites ainda a sofrer às mãos de homens desequilibrados, ainda muito está por fazer.

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