A Évora da minha adolescência era uma cidade ainda mais conservadora do que é hoje. Não eram muitas as meninas da minha idade que frequentavam os bares ou os cafés. Ao cinema iam acompanhadas das mães. Frequentavam as pastelarias ou salões de chã e nunca frequentavam o Café Portugal ( isso era só para adolescentes malucas ou drogadas). A noite era-lhes vedada a não ser a ida ao baile acompanhadas devidamente. As amizades com os rapazes só na escola ou numa ou outra festa de domingo há tarde. Por isso durante o dia desforravam-se e faziam coisas que jamais passariam pelas cabeças dos seus progenitores. A feira de S. João era por isso um espaço onde se esbaldavam. Passavam as tardes nas pistas e nos carroceis, provavam bebidas alcoólicas e flertavam com os rapazes da feira. Eles davam-lhes senhas e fichas e elas davam-lhes conversa. Para quem estava preso o ano inteiro aqueles momentos de liberdade eram o paraíso. Pouco habituadas a estas relações entre géneros era comum caírem direitinho nas cantadas baratas dos jovens das pistas, habituados a este tipo de engate fácil. Era por isso comum no final da feira o desaparecimento de duas ou três. Os pais aflitos asseguravam que elas tinham sido levadas pelos feirantes, nós porem sabíamos que elas tinham ido de livre vontade. um ou dois meses depois lá voltavam há cidade, afirmando a pés juntos que tinham sido levadas à força. Depois as rédeas apertavam ainda mais, algumas deixavam mesmo de frequentar a escola e meses depois nascia-lhes um novo irmão. Numa cidade tão pequena e onde tudo o que era segredo se sabia, todos fingiam acreditar. Foi num destes "desaparecimentos" da filha de uma colega da minha mãe que me servia de comparação de cada vez que eu fazia algo fora dos padrões ( o que era comum) e porque aquilo me chateava, que pela primeira vez soltei a frase que ainda hoje digo muitas vezes " E a maluca sou eu?".
alceu valença - 2025
Fui ver Alceu Valença ontem ao CCB, o homem tem 78 anos, mas ninguem dirá. Continua com a mesma voz, a mesma loucura, o mesmo encanto de sempre. Cantou musicas recentes e os grandes sucessos da sua grande carreira. Esteve em palco perto de 2horas, é obra para quem já anda nesta vida há muitas décadas. A acompanha-lo a orquestra de Ouro Preto, e é dela que vos quero falar. Uma orquestra formada por músicos muito novos, mas de uma qualidade superior. A orquestra acompanhou Alceu, mas fez arranjos de musicas do cantor e interpretou-as dando-lhes uma beleza própria, única, que pôs em pé o CCB inteiro. Mas eles não são só grandes músicos, não é só uma grande orquestra é sobretudo uma orquestra de gente que vibra, que toca a cantar baixinho, que dança na cadeira ao interpretar as musicas, uma das violinistas, Jovana Trifunovic , quase se levantava para dançar, ih,ih,ih, é gente feliz que está ali em palco. Tao diferente das nossas orquestras, que estão em palco a interpretar as musica...
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