entre barris de cerveja -2024

Porque amanha é 1º de Maio, conto-vos uma historia de uma véspera de 1º de Maio da década de 60, quando era proibido comemorar-se o Dia do Trabalhador!
Não vos digo os nomes pois ha familiares ainda por aqui e não gostam de ser lembrados do passado dos seus.
Morava na avenida uma senhora que era irmã e cunhada de militantes comunistas. O cunhado havia fugido e a irmã estava na mira da PIDE, era preciso faze-la sair da cidade. A coisa estava complicada, a senhora era seguida para todo o lado, já havia tentado sair de varias maneiras e os PIDES estavam sempre no seu encale-se. Um dia esta vizinha dos meus pais, preocupada pois sabia que mais dia menos dia prendiam a irmã, em conversa com o marido disse-lhe que ia pedir à minha mãe para ver se o meu pai, como tinha carro e era arbitro a tirava de Évora. O marido disse-lhe para não o fazer, não eram amigos, nunca tinha escutado os meus pais falar sobre o estado do Pais, a minha mãe era encarregada da fabrica, ainda a entregava e iam todos presos. A senhora aceitou e nada disse, mas as coisas apertavam para a irmã e um dia dirigiu-se à minha mãe e perguntou-lhe um pouco a medo, se era possível o meu pai quando fosse para os lado de Elvas arbitrar um jogo levar um familiar que ia visitar um primo. Não lhe disse quem era, nem a minha mãe perguntou. Em resposta, a minha mãe respondeu que era impossível, o carro ia cheio com os fiscais de linha, não dava para levar ninguem. A senhora voltou para casa em pânico, o marido tinha razão nunca deveria ter pedido. o marido brigou com ela, andaram ali uns dias a medo, mesmo com a minha mãe a cumprimenta-los da mesma forma, como se a conversa nunca tivesse existido, mesmo assim tinham receio, não sabiam o que esperar. Uns dias antes do 1º de maio, a minha mãe bateu-lhe à porta já o sol se tinha posto e disse-lhe " o seu familiar que vá às 5 da manha do dia 1 de maio ter à porta do Armazém, o carro da cerveja leva-a a Elvas". A mulher ficou sem saber o que fazer, o marido achava que era uma armadilha, mas a irmã colocada ao corrente, arriscou e na madrugada do 1º de Maio, entre barris de cerveja Sagres, num camião de uma das maiores empresas do Alentejo, a familiar da vizinha da minha mãe chegou a Elvas, para dai sair do Pais. Depois desse dia os meus pais e esses vizinhos ficaram amigos para a vida, até ao 25 de Abril de 74, nunca falaram sobre o assunto, nem mesmo quando a filha deles saiu para ir estudar para a URSS e a minha mãe lhe deu uma nota para as "ferias". Este era um assunto não abordado, um assunto que ficou só entre eles e o motorista do camião da cerveja. Já depois de 74, ouvi-as muitas vezes rir desse episodio e do facto da minha mãe usar os carros de um dos empresários do regime para ajudar neste tipo de actividades. Depois de 74 os meus pais ficaram também amigos da irmã e do cunhado destes seus vizinhos e muitas vezes os escutei dizer que "lhes devíamos muito" .
porque vos conto isto? Porque amanha é 1º de Maio e podem sair à vontade. Agradeçam, pois nem sempre fomos livres!

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