a tampa de sanita azul -2023
Hoje conto-vos outra historia de Natal, que me veio à memoria, porque ontem uma amiga me mandou uma fotografia da minha filha pequena. Quando ela era miúda, porque numa vida há muitas vidas, eu tinha sempre pouco dinheiro. Estava a começar a trabalhar a recibos verdes, tinha comprado uma casa pela qual pagava mais ao banco que o meu ordenado e tinha um orgulho desmedido ( que felizmente passou) não querendo por isso ajuda dos meus pais. A miúda escutava por isso muitas vezes "a mãe não tem dinheiro". Porque nasceu incrível, nesta altura do ano e noutras, olhava as montras, colocava as mãos atras das costas e em vez de pedir isto ou aquilo repetia a frase "a mãe não tem dinheiro". Não pensem que não me doía, doía, mas achei sempre que era melhor educa-la com a verdade e aquela era a nossa verdade. Por isso, no Natal quando escrevíamos a carta ao Pai Natal, pedia sempre coisas simbólicas, às vezes eu estava melhor e insistia e ela lá pedia algo mais caro, ou mais da moda. Outras a coisa estava apertada e ficávamos mesmo com o simbólico. O Natal não deixava de ser para ela uma coisa incrível, pois sem dinheiro, fazíamos prendas para lhe dar, criávamos brincadeiras, fazendo com que a falta de dinheiro não atrapalha-se. No ano em que entrou para a escola primaria, quis ela escrever a carta ao Pai Natal sozinha. Juntou as letras, pediu ajuda ao professor e a carta chegou-me por correio. ao abrir tive um dos maiores ataques de riso da minha vida. Pedia 1 única coisa. Não um brinquedo, um livro, ou uma roupa, mas algo que precisava, que já tinha pedido, mas que não tínhamos porque era caro, e eu tinha outras prioridades. Mas para ela era tão importante que a pediu ao Pai Natal. Queria a menina uma "tampa de sanita azul" . Ri-me a bom rir. Eu sabia que colocar o rabinho na loiça a incomodava pois estava frio, mas nunca tinha pensado que era mesmo algo prioritário. Como devem calcular comprei a tampa azul e fiz um esforço para comprar um brinquedo também. A alegria na noite de Natal, ao desembrulhar a tampa foi imperdível, todos os presentes se riam, naquela sala ninguem ficou tão contente com uma prenda do pai Natal como ela com a sua tampa de sanita. Ainda hoje, quando alguém não sabe o que dar a alguém, pergunta " e tampa de sanita queres?" Mas pasmem-se ela levou esta coisa da utilidade das prendas a um nível tal, que este ano quando perguntei o que queria, o que precisava pediu-me "uma janela" e eu ri de novo a bandeiras despegadas e lá a fiz dizer o que queria além da janela, que lhe vou dar claro, mas só a janela não é bem, afinal numa vida há muitas vidas e ela já pode ter algo mais que uma coisa util.
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